O regime dos contratos fora de estabelecimento e sua adopção em Portugal
Publicação:

SUMÁRIO
- Fontes:
1.1. Das Fontes Europeias em Geral
1.2. Das Fontes: evolução histórica
1.3. A Directiva 2011/83, de 25 de Outubro, do Parlamento Europeu e do Conselho;
1.4. O Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de Fevereiro, com as alterações decorrentes da Lei n.º 47/2014, de 28 de Julho e dos DL’s n.º 78/2018, de 15 de Outubro, n.º 9/2021, de 29 de Janeiro e n.º 109-G/2021, de 10 de Dezembro
- O que são os contratos fora de estabelecimento?
- Quais os que se lhes equiparam ou, melhor, se subsumem a um tal regime?
- Que espécies de contratos se eximem ao seu regime?
- Como se celebram tais contratos? São meramente consensuais ou haverá exigência de forma?
- Qual o clausulado do contrato delineado pelo legislador?
- Que direitos se conferem aos consumidores?
- Que excepções se prevêem ao direito de retractação?
- De que direitos desfrutam os fornecedores?
- E se do contrato não constar o direito de “retractação” [que o legislador português crismou, quanto a nós erroneamente, como de “resolução unilateral”] ou se não for entregue ao consumidor o “formulário de retractação” (ou desistência) que o deve acompanhar?
- Formulário de Retractação – Anexo
- Fontes
1.1. Das Fontes Europeias em Geral
O Direito da União Europeia é farol, é luzeiro no horizonte dos espaços nacionais que a constituem. O ordenamento dos Estados–membros é pontuado por intervenções legislativas persistentes dos seus órgãos legiferantes, quer se trate do Parlamento Europeu, quer do Conselho da União, constituído pelos ministros dos Estados-membros, quer ainda da Comissão Europeia (o verdadeiro Executivo da União), que ora legisla por meio de Directivas ….
De molde a alcançar os objectivos consignados nos Tratados, a União Europeia lança mão, consoante as circunstâncias e os órgãos de onde promanam, de profusa tipologia de actos normativos, alguns aplicáveis a todos os Estados-membros, outros exclusivamente a um número restrito.
Os instrumentos normativos, dir-se-ia de modo mais adequado, o arsenal legislativo da União Europeia compreende:
- Regulamentos,
- Directivas e
- Demais actos legislativos,
vinculativos, uns, outros, não.
Em que se traduz cada um deles?
Regulamentos
O «regulamento» é um acto legislativo vinculativo, aplicável em todos os seus elementos a todos os Estados-membros. [Quando a encefalopatia espongiforme bovina assolou a Europa, a então Comunidade Europeia adoptou um Regulamento da Segurança Alimentar, até hoje o quadro-normativo por excelência – o diploma matriz – no domínio sobre que versa]. O regulamento mais “badalado”, porém, e que influenciou decisivamente a legislação de outros espaços, como é o caso do Brasil, é o RGPD - Regulamento Geral de Protecção de Dados [Regulamento 2016/679, de 16 de Maio].
Os Regulamentos são o mais nobre, o acto legislativo por excelência: entram em vigor em todos os Estados-membros sem necessidade de transposição e uniformizam o direito em todo o Espaço Económico Europeu.
No entanto, para além dos Regulamentos emanados do Parlamento Europeu e do Conselho, a Comissão Europeia passou também a legislar por meio de Regulamentos [de execução], de que são exemplo os editados em sede de concepção ecológica dos produtos, no caso de molde a ampliar o seu tempo útil de vida, como, a título de exemplo, se invoca o Regulamento (UE) 2019/2023, de 1 de Outubro de 2019.
Com efeito, aí se estabelecem os requisitos de concepção ecológica aplicáveis às máquinas de lavar roupa para uso doméstico e às máquinas combinadas de lavar e secar roupa para uso doméstico, nos termos da Directiva 2009/125/CE. do Parlamento Europeu e do Conselho.
Directivas
A «directiva» é um acto legislativo que estabelece um objectivo geral a alcançar pelos Estados-membros da União Europeia. Cabe, porém, a cada um dos Estados-membros a elaborar a sua própria legislação de molde a cumprir um tal objectivo, nos termos e nos marcos temporais para o efeito estabelecidos. É disso exemplo a Directiva Direitos dos Consumidores de 2011, de 25 de Outubro, que de início tinha objectivos mais ambiciosos – daí o nome -, mas que depois se circunscreveu praticamente a traçar o regime dos contratos à distância e fora de estabelecimento [e pouco mais] que visou reforçar tais direitos, através designadamente da eliminação de encargos e custos ocultos na Internet e da extensão do período de que os consumidores dispõem para se retractarem de contratos com distintas tipologias.
As “directivas” eram, em geral, minimalistas – estabeleciam patamares mínimos de direitos, deixando-se a mão aos Estados a que os reforçassem, se o entendessem; surgiu, porém, em 2005 – a Directiva 2005/29, designada por “Das Práticas Comerciais Desleais” -, uma directiva maximalista, com uma disciplina uniforme, que os Estados-membros não poderiam exceder [nem menos nem mais do que o que nela se estabeleceu], uma sorte de Directiva-Regulamento, como o apodamos, sem que se dispensasse a sua transposição para os ordenamentos jurídicos internos. E, na sequência, surgiram as directivas “híbridas” com matérias inquestionáveis, que importavam uma superlativa protecção, limitativa, e com disposições outras em que se fixavam patamares mínimos que aos Estados seria lícito ultrapassar, com a Directiva de 2019 – 2019/771, de 20 de Maio de 2019 – que versou sobre os contratos de consumo e a garantias a eles conexas, que Portugal transpôs para o ordenamento pátrio a 18 de Outubro do ano transacto.
Decisões
Uma «decisão» só é vinculativa para os destinatários específicos (v. g., um dos Estados da União Europeia ou uma simples empresa), aplicando-se-lhes directamente. A Comissão adoptou, p. e., uma decisão relativa à participação da União Europeia no trabalho de várias organizações de luta contra o terrorismo. Tal decisão circunscrevia-se exclusivamente a esse lote de organizações.
Recomendações
As «recomendações» não são vinculativas, não têm um tal carácter ou natureza.
A adopção pela Comissão Europeia [o braço executivo, o “Governo” da União Europeia] de uma recomendação para que as autoridades judiciais dos Estados-membros intensificassem o recurso à videoconferência para reforçar a acção dos serviços judiciais além-fronteiras, não teve qualquer consequência jurídica. A recomendação permite às instituições dar a saber os seus pontos de vista e sugerir uma dada directriz, uma linha de actuação sem todavia impor uma obrigação legal aos seus destinatários.
Pareceres
O «parecer» é um instrumento que permite às instituições emitir uma opinião de modo não vinculativo, ou seja, sem impor uma qualquer obrigação legal aos seus destinatários.
Os pareceres não são vinculativos: podem ser emitidos por qualquer das instituições da União Europeia (Comissão, Conselho, Parlamento), pelo Comité das Regiões ou pelo Comité Económico e Social Europeu [CESE].
Em momento prévio à elaboração de uma qualquer legislação [ou após a apresentação da proposta respectiva pela Comissão Europeia], os comités referenciados, p.e., emitem pareceres acerca dos termos das propostas vindas a lume, consentâneos com as suas perspectivas e dos interesses que neles pontuam, quer emerjam das regiões, quer dos que conflituam nos planos económico e social prosseguidos pelo Comité respectivo [CESE]. Ou, numa outra formulação, independentemente das propostas de legislação em curso, é-lhes lícito fazer emitir pareceres de iniciativa tendentes a provocar a adopção de um qualquer texto legislativo, como no caso da Publicidade Infanto-Juvenil, que teve como relator o Conselheiro Jorge Pegado Liz e como perito nacional o Prof. Paulo de Morais, que não logrou, porém, convencer a Comissão Europeia da utilidade de uma legislação restritiva ou proibitiva da publicidade dirigida a crianças e jovens e que as envolva como intérpretes ou partícipes.
Fontes de Direito Subsidiário
As fontes de direito subsidiário são instrumentos jurídicos que não constam especificamente nos Tratados.
Uma tal categoria inclui:
- a Jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE (TJUE);
- o direito internacional — que é muitas vezes uma fonte de inspiração para o TJUE na elaboração da sua jurisprudência, que se refere a uma tal fonte reenviando para o direito escrito, os usos e os costumes;
- os princípios gerais de direito — fontes não escritas emergentes da jurisprudência do TJUE: tais princípios permitiram que o TJUE fixasse regras em diversos domínios relativamente aos quais os Tratados nada prevêem.
Uma nota final, já que se referiu às fontes de direito subsidiário, às fontes de direito primário, que resultam dos Tratados que instituem a União Europeia, a saber,
- O Tratado da União Europeia,
- o Tratado sobre o Funcionamento da UE e
- o Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom).
Tais tratados enunciam a repartição de competências entre a União Europeia e os seus Estados-membros e estabelecem os poderes das instituições europeias: determinam destarte o quadro jurídico no âmbito do qual as instituições da União aplicam as políticas europeias.
- O direito primário inclui também, como importa assinalar:
- os Tratados modificativos da UE;
- os Protocolos anexados aos tratados fundadores e aos tratados modificativos;
- os Tratados de adesão dos Estados-membros da UE;
- a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (desde a adopção do Tratado de Lisboa, em Dezembro de 2009);
- os Princípios Gerais de Direito estabelecidos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.
Os mais instrumentos, como os que se recortaram de início constituem o Direito Derivado.
1.2. Das Fontes: evolução histórica
No que em particular se prende com as fontes do direito de que ora nos ocupamos [o regime dos contratos celebrados fora de estabelecimento comercial], realce para o que, em tempo remoto, constituiu os primórdios do regime, no plano europeu:
Remonta a 1985 [Portugal só ingressou na então Comunidade Económica Europeia no 1.º de Janeiro de 1986] o primeiro diploma europeu vertido sobre uma tal temática:
- a Directiva n.º 85/577/CEE, do Conselho, de 20 de Dezembro de 1985, relativa à protecção dos consumidores em matéria de contratos negociados fora dos estabelecimentos comerciais.
- Portugal, pós-adesão, bem entendido, transpôs um tal instrumento normativo para o ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto-Lei 272/87, de 03 de Abril.
Como se assinala no preâmbulo do DL 24/2014, de 14 de Fevereiro, “constituiu, então, um passo muito importante na prossecução da política de defesa do consumidor [a adopção do DL 272/87, de 03 de Abril], designadamente ao impor o cumprimento de deveres de informação pré-contratual perante o consumidor, o respeito de determinados requisitos quanto à celebração desses contratos e reconhecer a existência do direito de [retractação], a exercer no prazo de sete dias úteis a contar da celebração do contrato.
Foi também no âmbito deste mesmo decreto-lei que se definiu o conceito das «vendas por correspondência» e se proibiram as vendas «em cadeia», «em pirâmide» ou em «bola de neve», bem como as «vendas forçadas».
Decorridos mais de 10 anos sobre a data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 272/87, de 3 de Abril, o surgimento de novas formas de venda e a necessidade de transposição de novo instrumento de direito europeu - a Directiva n.º 97/7/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 1997, relativa à protecção dos consumidores em matéria de contratos celebrados à distância - impuseram uma alteração aprofundada do regime jurídico aplicável às vendas ao domicílio e contratos equiparados.
E prossegue o preâmbulo do diploma ora vigente:
“Assim, em 2001, foi publicado o Decreto-Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril [alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 57/2008, de 26 de Março, 82/2008, de 20 de Maio e 317/2009, de 30 de Outubro], que, transpondo para a ordem jurídica nacional a referida Directiva n.º 97/7/CE [de 20 de Maio de 1997], veio adequar o regime ao novo contexto económico, melhorando algumas soluções e abarcando novas modalidades de venda com vista a proteger direitos e interesses dos consumidores.
O … Decreto-Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril, consagrou não só as regras aplicáveis aos contratos celebrados à distância e aos contratos celebrados no domicílio, mas também considerou ilegais determinadas formas de venda de bens ou de prestação de serviços assentes em processos de aliciamento enganosos e revogou expressamente o Decreto-Lei n.º 272/87, de 3 de Abril.
Nesse mesmo ano, a Comissão Europeia aprovou uma Proposta de Directiva relativa aos direitos dos consumidores que visava alterar profundamente diversos regimes aplicáveis aos contratos de consumo.
A negociação desta proposta de directiva foi complexa e difícil dada a abrangência das matérias e o facto de consagrar o princípio comunitário da harmonização total.
Concluída a negociação, foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia a Directiva n.º 2011/83/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Outubro de 2011, relativa aos direitos dos consumidores, que alterou a Directiva n.º 93/13/CEE, do Conselho, e a Directiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, e revogou a Directiva n.º 85/577/CEE, do Conselho e a Directiva n.º 97/7/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho.
Esta Directiva tem por objectivo contribuir, graças à consecução de um elevado nível de defesa dos consumidores, para o bom funcionamento do mercado interno, aproximando as legislações dos Estados-membros, em especial, nas matérias relativas à informação pré-contratual, aos requisitos formais e ao direito de [retractação] … nos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial estabelecendo, para esse efeito, o referido princípio da harmonização total [vale dizer, a uniformização da disciplina de que se cura de Helsínquia, na Finlândia, à Ilha do Pico, nos Açores]” em vista da criação do Mercado Único Europeu.
1.3. A Directiva 2011/83, de 25 de Outubro, do Parlamento Europeu e do Conselho
A Directiva de que se cura foi a que, revogando o mais, influenciou decisivamente, por imperativo a que se adscrevem os Estados-membros, o direito dos contratos, mormente o dos contratos à distância e o dos contratos fora de estabelecimento.
Disciplina que veio a ser retocada pela Directiva Omnibus – a Directiva n.º 2019/2161, de 27 de Novembro – que alterou, em particular, determinados dispositivos do instrumento sobre que actuara inovatoriamente. (1)
1.4. DL 24/2014, de 14 de Fevereiro,
O Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de Fevereiro, que transpõe para o ordenamento jurídico pátrio a Directiva 2011/83, de 25 de Outubro, do Parlamento Europeu e do Conselho, foi, nalguma medida por menor afinação, objecto de alterações decorrentes da Lei n.º 47/2014, de 28 de Julho e dos DL’s n.º 78/2018, de 15 de Outubro, n.º 9/2021, de 29 de Janeiro e n.º 109-G/2021, de 10 de Dezembro [diploma este que verteu no ordenamento as disposições pertinentes da Directiva Omnibus, precedentemente referenciada].
São estas directivas que se acham na génese do DL 24/2014, de 14 de Fevereiro que, com as assinaladas alterações, hoje rege um tal domínio em Portugal.
O diploma legal em epígrafe, como se assinalou, foi objecto de uma mancheia de alterações provocadas pelo Decreto-Lei n.º 109-G/2021, de 10 de Dezembro, que, por seu turno, foi o veículo de transposição da denominada Directiva OMNIBUS (2).De que cumpre sobremodo evidenciar o que figura exactamente em nota de rodapé neste passo referenciada.
- O que são Contratos Fora de Estabelecimento?
Contratos fora do estabelecimento comercial são os que ocorrem na presença física simultânea do fornecedor e do consumidor em local que não seja o estabelecimento mercantil de quem negoceia com a clientela: neles se incluem ainda os que decorrem de uma proposta formulada pelo próprio consumidor.
Mas há contratos que beneficiam das mesmas regras dos contratos fora do estabelecimento e, no entanto, são celebrados dentro de um estabelecimento comercial. E nem sempre se tem essa noção, como no passo seguinte se versará.
- Quais os contratos que se lhes equiparam ou se subsumem a um tal regime?
Figuram nesse particular os contratos celebrados
- no estabelecimento comercial do fornecedor ou através de quaisquer meios de comunicação à distância imediatamente após o consumidor ter sido, pessoal e individualmente, contactado em local que não seja o do estabelecimento de que se trata (contactos de rua);
- no domicílio do consumidor (porta-a-porta);
- no local de trabalho do consumidor (contratos de ocasião);
- em reuniões em que a oferta seja promovida por demonstração perante um grupo de pessoas reunidas no domicílio de uma delas, a pedido do fornecedor (ou seu representante) (reuniões “tupper-ware”);
- durante uma deslocação organizada pelo fornecedor (ou seu representante) fora do respectivo estabelecimento comercial (contratos “tipo” “conheça a… Galiza grátis”);
- no local indicado pelo fornecedor, a que o consumidor se desloque, por sua conta e risco, na sequência de uma comunicação comercial feita por aquele (ou um seu representante).
Há, neste particular, ao menos, duas situações – a primeira e a última -, em que o contrato é susceptível de ser celebrado no interior de um estabelecimento mercantil do fornecedor e o consumidor beneficiará, no entanto, do regime dos contratos fora de estabelecimento. O que, a levar-se à letra o preceito, estariam consequentemente excluídos do regime a que se alude.
- Quais os contratos que se eximem, se furtam a este regime?
Eximem-se do regime de que se trata os contratos que, ainda que celebrados fora de um qualquer estabelecimento comercial, da tipologia de tais modelos negociais se apartam.
Aí figuram os contratos
- de serviços financeiros (aqui há um regime especial, previsto noutro diploma legal, desde que à distância: Directiva n.º 2002/65/CE, de 23 de Setembro, Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de Maio);
- celebrados através de máquinas distribuidoras automáticas ou de estabelecimentos comerciais automatizados;
- com operadores de telecomunicações (em cabines telefónicas públicas ou à utilização de uma única ligação telefónica, de Internet ou de telecópia efectuada pelo consumidor);
- de construção, reconversão substancial, compra e venda ou a outros direitos relativos a imóveis, incluindo os contratos de arrendamento;
- de serviços sociais, nomeadamente no sector da habitação, da assistência à infância e serviços dispensados às famílias e às pessoas com necessidades especiais permanentes ou temporárias, incluindo os cuidados continuados;
- de cuidados de saúde, prestados ou não no âmbito de uma estrutura de saúde e independentemente do seu modo de organização e financiamento e do seu carácter público ou privado;
- de jogos de fortuna ou azar, incluindo lotarias, bingos e actividades de jogo em casinos e apostas;
- de viagens turísticas (pacotes turísticos);
- de habitação periódica ou turística, cartões turísticos e de férias e afins;
- de géneros alimentícios, bebidas ou outros bens destinados ao consumo corrente do agregado familiar, entregues fisicamente pelo fornecedor em deslocações frequentes e regulares ao domicílio, residência ou local de trabalho do consumidor;
- em que intervenha titular de cargo público obrigado por lei à autonomia e imparcialidade (notário, conservador…);
- de transporte de passageiros e
- de aquisição de assinaturas de publicações periódicas, cujo preço não exceda 40 €.
- de bens vendidos por via de penhora, ou de qualquer outra forma de execução judicial.
- Como se celebram tais contratos? São meramente consensuais [basta um aperto de mão] ou haverá exigência de forma [terão de ser de papel passado]?
A Lei dos Contratos Fora de Estabelecimento prescreve, no seu artigo 9.º, o que segue:
Requisitos de forma nos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial
- O contrato celebrado fora do estabelecimento comercial é reduzido a escrito e deve, sob pena de nulidade, conter, de forma clara e compreensível e na língua portuguesa, o clausulado a que se alude em 6.
- O fornecedor … deve entregar ao consumidor uma cópia do contrato assinado ou a confirmação do contrato em papel ou, se o consumidor concordar, noutro suporte duradouro, incluindo, se for caso disso, a confirmação do consentimento prévio e expresso do consumidor e o seu reconhecimento, nos termos da alínea l) do n.º 1 do artigo 17.º [a saber: “fornecimento de conteúdos digitais não fornecidos em suporte material com uma obrigação de pagamento quando:
- i) O consumidor consentir prévia e expressamente que a execução tenha início no decurso do período de ponderação ou reflexão (de 14 ou 30 dias, consoante os casos, e reconhecer que o seu consentimento implica a perda do tal direito de retractação; e
- ii) O fornecedor de conteúdos digitais tenha fornecido a confirmação, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º ou do artigo 6.º]
Esses contratos são como os contratos normais em que as pessoas se obrigam só de boca? Em que basta um aperto de mão e está tudo acertado? Ou não? Como se celebram, pois, tais contratos?
São, como se revelou, reduzidos a escrito. Se o não forem, são nulos e de nenhum efeito. E a nulidade é susceptível de ser invocada por qualquer interessado a todo o tempo e conhecida de ofício pelo julgador (pelos tribunais em sentido amplo).
E devem conter, de forma clara e compreensível e em língua portuguesa, as informações constantes de uma outra norma do diploma legal de que se trata e se versará no ponto subsequente [o n.º 6]. Sob pena também de nulidade.
O fornecedor deve entregar ao consumidor uma cópia do contrato assinado ou a confirmação do contrato em papel ou, se o consumidor concordar, noutro suporte duradouro, incluindo, se for caso disso, a confirmação do consentimento prévio e expresso do consumidor e o seu reconhecimento.
Convém significar que por “suporte duradouro” se entende qualquer instrumento, designadamente o papel, a chave Universal Serial Bus (USB), o Compact Disc Read-Only Memory (CD-ROM), o Digital Versatile Disc (DVD), os cartões de memória ou o disco rígido do computador, que permita ao consumidor ou ao fornecedor armazenar informações que lhe sejam pessoalmente dirigidas, e, mais tarde, aceder-lhes pelo tempo adequado à finalidade das informações, e que possibilite a respectiva reprodução inalterada.
- Qual o clausulado do contrato delineado pelo legislador?
Do clausulado do contrato constarão, em razão do que a lei prescreve no artigo 4.º, algo que é comum aos contratos à distância [como os que se processam no âmbito, designadamente, do comércio electrónico B2C], como aos celebrados fora de estabelecimento.
INFORMAÇÃO PRÉ-CONTRATUAL NOS CONTRATOS …
CELEBRADOS FORA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL
1 - Antes de o consumidor se vincular a um contrato celebrado… fora do estabelecimento comercial, ou por uma proposta correspondente, o fornecedor de bens … deve facultar-lhe, em tempo útil e de forma clara e compreensível, as seguintes informações:
a) Identidade do fornecedor de bens ou do prestador de serviços, incluindo o nome, a firma ou denominação social, o endereço físico onde se encontra estabelecido, o número de telefone e o endereço electrónico, caso existam, de modo a permitir ao consumidor contactá-lo e comunicar de forma rápida e eficaz;
b) Quando aplicável, o endereço físico e identidade do profissional que actue por conta ou em nome do fornecedor de bens ou prestador de serviços;
c) O endereço físico do estabelecimento comercial do profissional, no caso de ser diferente do endereço comunicado nos termos do que antecede e, se aplicável, o endereço físico do profissional por conta de quem actua, onde o consumidor possa apresentar uma reclamação.
d) Características essenciais do bem ou serviço, na medida adequada ao suporte utilizado e ao bem ou serviço objecto do contrato;
e) Preço total do bem ou serviço, incluindo taxas e impostos, encargos suplementares de transporte, despesas postais ou de entrega ou quaisquer outros encargos que no caso caibam;
f) O modo de cálculo do preço, incluindo tudo o que se refira a quaisquer encargos suplementares de transporte, de entrega e postais, e quaisquer outros custos, quando a natureza do bem ou serviço não permita o cálculo em momento anterior à celebração do contrato;
g) A indicação de que podem ser devidos encargos suplementares de transporte, de entrega e postais, e quaisquer outros custos, quando tais encargos não possam ser razoavelmente calculados antes da celebração do contrato;
h) O preço total, que deve incluir os custos totais, por período de facturação, no caso de um contrato de duração indeterminada ou que inclua uma assinatura de periodicidade;
i) O preço total equivalente à totalidade dos encargos mensais ou de outra periodicidade, no caso de um contrato com uma tarifa fixa, devendo ser comunicado o modo de cálculo do preço quando for impossível o seu cálculo em momento anterior à celebração do contrato;
j) Modalidades de pagamento, de entrega, de execução, a data-limite em que o fornecedor se compromete a entregar o bem ou a prestar o serviço, e, se for o caso, o sistema de tratamento de reclamações dos consumidores pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços;
l) A informação de que o preço foi personalizado com base numa decisão automatizada, quando aplicável;
m) Quando seja o caso, a existência do direito de retractação do contrato, o respectivo prazo e o procedimento para o exercício do direito, nos termos dos artigos 10.º e 11.º com entrega do formulário de retractação constante da parte B do anexo ao diploma legal de que se trata, que dele faz parte integrante;
n) Quando seja o caso, a indicação de que o consumidor suporta os custos da devolução dos bens em caso de exercício do direito de retractação e o montante desses custos, se os bens, pela sua natureza, não puderem ser devolvidos normalmente pelo correio normal;
o) A obrigação de o consumidor pagar ao prestador de serviços um determinado montante, proporcional ao serviço já prestado, sempre que o consumidor exerça o direito de retractação depois de ter apresentado o pedido a que se refere o artigo 15.º [;
p) Quando não haja direito de retractação, de acordo com o que a tal propósito se consigna em 4 por tais contratos se não subsumirem no regime estabelecido para o efeito, a indicação de que o consumidor não beneficia desse direito ou, se for caso disso, as circunstâncias em que o consumidor perde o seu direito de retractação;
q) Custo de utilização da técnica de comunicação à distância, quando calculado em referência a uma tarifa que não seja a tarifa base;
r) A duração do contrato, quando não seja indefinida ou instantânea, ou, em caso de contrato de fornecimento de bens ou prestação de serviços de execução continuada ou periódica ou de renovação automática, os requisitos da denúncia, incluindo, quando for o caso, o regime de contrapartidas estabelecidas para a cessação antecipada dos contratos sujeitos a períodos contratuais mínimos;
s) A existência e o prazo da garantia de conformidade dos bens, dos conteúdos ou serviços digitais, quando seja aplicável o regime jurídico da venda de bens de consumo constante do Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro;
t) A existência e condições de assistência pós-venda, de serviços pós-venda e de garantias comerciais quando for o caso;
u) A existência de códigos de conduta relevantes, quando os haja, e o modo de obter as respectivas cópias;
v) A duração mínima das obrigações dos consumidores decorrentes do contrato, quando for o caso;
x) A existência de depósitos ou outras garantias financeiras e respectivas condições, a pagar ou prestar pelo consumidor a pedido do fornecedor, quando as houver;
z) Funcionalidade dos bens com elementos digitais, conteúdos ou serviços digitais, incluindo medidas de protecção técnica, quando aplicável;
aa) Qualquer compatibilidade e interoperabilidade relevante dos bens com elementos digitais, conteúdos ou serviços digitais de que o fornecedor tenha ou possa razoavelmente ter conhecimento, se for caso disso;
bb) A possibilidade de acesso a um mecanismo extrajudicial de reclamação e recurso a que o profissional esteja vinculado e o modo de acesso a esse mesmo mecanismo, quando for o caso.
2 - Sem prejuízo do que noutro passo se dispõe [identidade do fornecedor de bens ou do prestador de serviços, incluindo o nome, a firma ou denominação social, o endereço físico onde se encontra estabelecido, o número de telefone e o endereço electrónico, caso existam, de modo a permitir ao consumidor contactá-lo e comunicar de forma rápida e eficaz], no caso de o fornecedor de bens ou prestador de serviços fornecer outro meio de comunicação em linha que permita ao consumidor conservar toda a correspondência escrita mantida, inclusive a data e a hora da correspondência, num suporte duradouro, a informação deve incluir dados pormenorizados sobre esse outro meio que deve permitir o contacto rápido e eficaz com o profissional.
3 - As informações [constantes infra e que correspondem às alíneas l), m) e n) do número 1] podem ser prestadas mediante o modelo de informação sobre o direito de [retractação] constante da parte A do anexo ao diploma legal em apreciação, do qual faz parte integrante, considerando-se que o fornecedor de bens ou prestador de serviços cumpriu o dever de informação quanto a esses elementos, se tiver entregado essas instruções ao consumidor correctamente preenchidas.
[listam-se neste passo as pertinentes informações:
- A informação de que o preço foi personalizado com base numa decisão automatizada, quando aplicável [preceito inovador];
- Se for o caso, a existência do direito de retractação do contrato, o respectivo prazo e o procedimento para o seu exercício, com entrega do formulário de retractação constante da parte B do anexo ao diploma legal de que se trata, que dele faz parte integrante [ínsito no ponto 10 do presente trabalho];
- Se for ainda o caso, a indicação de que o consumidor suporta os custos da devolução dos bens na hipótese do exercício do direito de retractação se os bens, pela sua natureza, não puderem ser devolvidos regularmente pela mala postal normal]
4 - As informações [os dados constantes do n.º 1, que são como que o clausulado do contrato de adesão] integram o contrato celebrado … fora do estabelecimento comercial, não podendo o respectivo conteúdo ser alterado, salvo acordo expresso das partes em contrário anterior à celebração do contrato.
5 - Em caso de incumprimento do dever de informação quanto aos encargos suplementares ou outros custos referidos nas alíneas e), f), g), h) e i) ou quanto aos custos de devolução dos bens referidos na alínea m), ambas do n.º 1, o consumidor fica desobrigado de tais custos ou encargos.
6 - As informações a que se refere o n.º 1 são, no caso dos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial, fornecidas em papel ou, se o consumidor concordar, noutro suporte duradouro.
7 - …
8 - Incumbe ao fornecedor de bens ou prestador de serviços a prova do cumprimento dos deveres de informação estabelecidos no presente artigo.
- Que direitos se reconhecem nestes contratos aos consumidores?
O consumidor tem o direito de desistir do contrato [de se retractar, de dar “o dito por não dito”] sem incorrer, em princípio, em quaisquer custos e sem necessidade de indicar o motivo, no prazo de 14 dias, em geral, nos contratos fora de estabelecimento, e no de 30 dias, em especial no que tange aos contratos ao domicílio e nos celebrados no decurso de excursões promovidas pelo fornecedor. a contar:
- Do dia da celebração do contrato, no caso dos contratos de prestação de serviços;
- Do dia em que o consumidor ou um terceiro, com excepção do transportador, indicado pelo consumidor, adquirir a posse física dos bens, no caso dos contratos de compra e venda.
- …
Tal direito é, porém,
- imotivável (não sendo necessário invocar qualquer motivo, causa ou fundamento para o exercer);
- inindemnizável (não há que indemnizar ou compensar, em princípio, o fornecedor pela “ruptura” do contrato…)
- irrenunciável (o consumidor não pode a tal renunciar por se tratar de direito cuja natureza é imperativa, como o impõe o artigo 29 da Lei dos Contratos à Distância e Fora de Estabelecimento).
Aludiu-se ao facto de, em princípio, o consumidor não estar sujeito a encargos advenientes do exercício do direito de retractação. Em princípio. É que o consumidor incorrerá, porém, nas despesas de devolução da coisa se, de harmonia com o que prescreve o n.º 3 do artigo 12, houver solicitado, expressamente, uma modalidade de entrega diferente e mais onerosa do que comummente aceite e menos onerosa, proposta, aliás, pelo fornecedor.
Mas a regra vigente, pós-Directiva Direitos do Consumidor, é a de que incumbe ao consumidor suportar os custos inerentes à devolução da coisa, excepto se o fornecedor acordar em fazê-lo ou se não houver sido previamente informado de que tais encargos correm a expensas suas.
O que surge, por vezes, como que um desincentivo a que o consumidor exerça o direito e é um verdadeiro nonsense. Mas é o que consta da Directiva e do normativo de transposição.
- Que excepções se prevêem ao direito de retractação?
Eis o rol de excepções ao direito de retractação
Salvo acordo das partes em contrário, o consumidor não pode retractar-se nos contratos de:
? Prestação de serviços com obrigação de pagamento, quando:
o Os serviços tenham sido integralmente prestados após o prévio consentimento expresso do consumidor; e
o O consumidor reconheça que perde o direito de retractação se o contrato tiver sido plenamente executado pelo prestador em tais circunstância;
Fornecimento de [bens]
? ou de prestação de serviços cujo valor dependa de flutuações de taxas do mercado financeiro que o prestador não possa controlar e possam ocorrer durante o período de retractação;
? confeccionados de acordo com especificações do consumidor ou manifestamente personalizados;
? que, por natureza, não possam ser reenviados ou susceptíveis de se deteriorar ou ficar rapidamente fora da validade;
? selados insusceptíveis de devolução, por motivos de protecção da saúde ou de higiene quando abertos após a entrega;
? que, após a entrega e por natureza, fiquem inseparavelmente misturados com outros artigos;
? bebidas alcoólicas cujo preço tenha sido acordado aquando da celebração do contrato de compra e venda, cuja entrega apenas possa ser feita para além de um período de 30 dias, cujo valor real dependa de flutuações do mercado insusceptíveis de controlo pelo fornecedor;
? gravações áudio, vídeo ou de programas informáticos selados, a que o haja retirado o selo de garantia de inviolabilidade pós- entrega;
? um jornal, periódico ou revista, com excepção dos contratos de assinatura para o envio dessas publicações;
? alojamento, para fins não residenciais, transporte de bens, serviços de aluguer de automóveis, restauração ou serviços relacionados com actividades de lazer se o contrato previr uma data ou período de execução específicos;
? conteúdos digitais não fornecidos em suporte material com uma obrigação de pagamento quando:
o O consumidor consentir prévia e expressamente que a execução tenha início durante o prazo de retractação e reconhecer que o seu consentimento implica a perda do direito de tal direito; e
o O fornecedor de conteúdos digitais haja efectuado a confirmação do contrato e do consentimento prévio e expresso do consumidor e o seu reconhecimento, de harmonia com a lei.
? Prestação de serviços de reparação ou de manutenção a executar no domicílio do consumidor, a instâncias suas.
No caso dos contratos a que se alude no passo imediatamente anterior, é aplicável o direito de retractação a serviços prestados além dos especificamente solicitados pelo consumidor ou ao fornecimento de bens diferentes dos das peças de substituição imprescindíveis para se efectuar a manutenção ou reparação.
- E se do contrato não constar o direito de “dar o dito por não dito” ou se não for entregue ao consumidor o “formulário de desistência” que o deve acompanhar?
Se o fornecedor não cumprir o dever de informação pré-contratual alusivo ao direito de retractação ou de desistência (que é de 14 dias, em geral, e de 30 dias para os celebrados no domicílio ou no decurso de excursões promovidas pelo promotor) nem anexar ao contrato o “formulário de desistência”, o prazo para o efeito passa a ser de 12 meses a contar do termo prazo inicial (dos 14 dias ou dos 30 dias, respectivamente).
12 meses, que não 14 dias. 12 meses que acrescem aos 14 dias cuja menção se omitiu.
12 meses, que não 30 dias, no caso aplicável. 12 meses que acrescem aos 30 dias cuja menção se omitiu deliberadamente.
12 meses que acrescem aos prazos regulares para dar o “dito por não dito”. Sem mais, nem menos.
E se, por hipótese, do contrato constar uma cláusula que imponha ao consumidor a renúncia ao “direito de desistência” (o que começa a suceder em determinadas circunstâncias, por estranho que pareça… ou talvez não!), dado que os direitos conferidos ao consumidor e impostos como deveres ao fornecedor são imperativos, prevalece o prazo de 12 meses para o exercício de tal direito (o de retractação, o de se “dar o dito por não dito”).
- A que obrigações decorrentes da retractação está sujeito o fornecedor?
Que obrigações tem o fornecedor, o comerciante, se o consumidor exercer o seu “direito de dar o dito pelo não dito”?
No prazo de 14 dias a contar da data em que for informado da decisão de retractação, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve reembolsar o consumidor de todos os pagamentos recebidos, incluindo os custos de entrega do bem.
O reembolso dos pagamentos deve ser feito através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transacção inicial, salvo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso.
O fornecedor não é obrigado a reembolsar os custos adicionais de entrega quando o consumidor houver solicitado, expressamente, uma modalidade de entrega diferente e mais onerosa do que a modalidade comummente aceite e menos onerosa por ele, fornecedor, proposta.
Exceptuados os casos em que o fornecedor se ofereça para recolher ele próprio os bens, só é permitida a retenção do reembolso enquanto os bens não forem recebidos ou enquanto o consumidor não apresentar prova da devolução do bem.
Quando o bem entregue no domicílio do consumidor no momento da celebração de um contrato celebrado fora do estabelecimento comercial, não puder, pela sua natureza ou dimensão, ser devolvido por correio, incumbe ao fornecedor recolher o bem e suportar o respectivo custo.
DEVOLUÇÃO DO QUANTUM EM DOBRO
EM CASO DE MORA DO FORNECEDOR
DIREITO A INDEMNIZAÇÃO POR DANOS
O incumprimento da obrigação de reembolso dentro do prazo de 14 dias, obriga o fornecedor de bens a devolver em dobro, no prazo de 15 dias úteis, os montantes pagos pelo consumidor, sem prejuízo do direito do consumidor a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.
E quais são as obrigações do consumidor caso entenda pôr fim ao contrato, no uso do seu direito de “dar o dito pelo não dito”?
Obrigações do consumidor decorrentes da retractação do contrato
Caso o fornecedor de bens não se ofereça para recolher ele próprio o bem, o consumidor deve no prazo de 14 dias a contar da data em que tiver comunicado a sua decisão de pôr termo ao contrato, devolver ou entregar o bem ao fornecedor de bens ou a uma pessoa autorizada para o efeito.
O consumidor suportará o custo da devolução do bem, excepto nos seguintes casos:
- Quando o fornecedor acordar em suportar esse custo; ou
- Quando o consumidor não tiver sido previamente informado pelo fornecedor do bem que tem o dever de pagar os custos de devolução.
O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização, durante os 14 dias, ao fornecedor ou à pessoa para tal designada no contrato.
O consumidor não incorre em responsabilidade alguma pelo exercício do direito de retractação, salvo se tiver solicitado, expressamente, uma modalidade de entrega diferente e mais onerosa do que a modalidade comummente aceite e menos onerosa proposta pelo fornecedor, caso em que suportará tais encargos.
- CONCLUSÕES
1.ª O Código de Defesa do Consumidor, em vigor no Brasil, no capítulo “da protecção contratual”, um só artigo consagra – o 49 – aos contratos fora de estabelecimento (especialmente por telefone ou a domicílio) para cometer ao consumidor um prazo de reflexão de sete dias para o exercício do direito de desistência [“o consumidor pode desistir do contrato no prazo de sete dias a contar da sua assinatura ou do acto do recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora de estabelecimento comercial, por telefone ou a domicílio”];
2.ª O regime europeu é muito mais complexo, muito mais elaborado, com inúmeros ‘rodriguinhos’, ajustado não só aos contratos electrónicos e demais contratos celebrados por meios de comunicação à distância (de que se não cura no presente trabalho) como fora de estabelecimento;
3.ª Há uma panóplia de contratos, no regime europeu, que o legislador subsume à disciplina dos contratos fora de estabelecimento e que constituem manifestações do quotidiano que cumpre zelosamente acautelar;
4.ª Há uma mancha de contratos que, podendo ajustar-se ao modelo dos contratos fora de estabelecimento, se excluem da disciplina que lhes quadra pela natureza que se lhes reconhece;
5.ª Há uma exigência de forma – trata-se de contratos formais -, cuja inobservância conduz à nulidade do contrato “expressis verbis”;
6.ª As menções obrigatórias constantes do clausulado do contrato são desenhadas com minúcia pelo legislador de molde a assegurar o mais elevado nível de protecção ao consumidor;
7.ª Confere-se ao consumidor uma amplo direito de retractação (o legislador brasileiro cognomina-o de arrependimento…) que, em geral, é o dobro do consignado no Código brasileiro (14 dias) e que para os contratos ao domicílio propriamente (porta-a-porta) e os celebrados no decurso de excursões organizadas pelos promotores atingem hoje os 30 dias (regra cuja vigência principiou a 28 de Maio pretérito) e, caso tal direito se omita no clausulado, determinará uma mais extensa dimensão temporal (12 meses) que acrescerá, para o efeito, ao período inicial de retractação.
8.ª Assim como há contratos excluídos do regime, também se prevê uma mancheia de excepções ao direito de retractação, a menos que se acorde em contrário, dada a natureza das espécies contratuais em jogo;
9.ª A lei apensa, em anexo, um formulário de retractação que tem de acompanhar o contrato, como veículo para o exercício do direito de desistência que se outorga ao consumidor, conquanto o titular do direito possa fazê-lo por qualquer meio, de forma inequívoca, contanto que preserve os pertinentes elementos de prova;
9.ª Confere-se aos consumidores, caso exerçam o direito de retractação, a restituição pelo fornecedor do preço pago e, caso ocorra a mora por lei prevista, a devolução ter-se-á de operar em dobro;
10.ª Os fornecedores desfrutam de direitos, se a retractação se actuar, que a lei recorta convenientemente, contrapondo-os ao consumidor.
- Formulário de Retractação
ANEXO
[a que se refere alínea m) do n.º 1 e o n.º 3 do artigo 4.º]
A. Formulário de informação sobre o direito de [retractação]
Direito de [retractação]
O consumidor tem o direito de [retractação] do presente contrato no prazo de 14 dias de calendário, ou no caso dos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial mencionados nas subalíneas ii) [contratos celebrados no domicílio] e v) da alínea i) [contratos celebrados no decurso de uma excursão organizada pelo promotor ou um seu representante] do artigo 3.º, no prazo de 30 dias de calendário, sem necessidade de indicar qualquer motivo.
O prazo para exercício do direito de [retractação] expira 14 dias, ou 30 dias, a contar do dia seguinte ao dia (1)
A fim de exercer o seu direito de [retractação], tem de nos comunicar (2) a sua decisão de [retractação] do presente contrato por meio de uma declaração inequívoca (por exemplo, carta enviada pelo correio ou correio electrónico). Pode utilizar o modelo de formulário de [retractação], mas tal não é obrigatório. (3)
Para que o prazo de [retractação] seja respeitado, basta que a sua comunicação referente ao exercício do direito de [retractação] seja enviada antes do termo do prazo ….
Efeitos da [retractação]
Em caso de retractação do presente contrato, ser-lhe-ão reembolsados todos os pagamentos efectuados, incluindo os custos de entrega (com excepção de custos suplementares resultantes da sua escolha de uma modalidade de envio diferente da modalidade menos onerosa de envio normal por nós oferecida), sem demora injustificada e, em qualquer caso, o mais tardar 14 dias a contar da data em que formos informados da sua decisão de resolução do presente contrato. Efectuamos esses reembolsos usando o mesmo meio de pagamento que usou na transacção inicial, salvo acordo expresso em contrário da sua parte; em qualquer caso, não incorre em quaisquer custos como consequência de tal reembolso
(4)
(5)
(6)
Instruções de preenchimento:
(1) Inserir um dos seguintes textos entre aspas:
a) No caso de um contrato de prestação de serviços ou de um contrato de fornecimento de água, de gás ou de electricidade, caso não sejam postos à venda em volume ou quantidade limitados, de aquecimento urbano ou de conteúdos digitais que não sejam fornecidos num suporte material: «da celebração do contrato.»;
b) No caso de um contrato de compra e venda: «em que adquire ou um terceiro por si indicado, que não seja o transportador, adquire a posse física dos bens.»;
c) No caso de um contrato em que o consumidor encomendou vários bens numa única encomenda e os bens são entregues separadamente: «em que adquire ou um terceiro por si indicado, que não seja o transportador, adquire a posse física do último bem.»;
d) No caso de um contrato relativo à entrega de um bem constituído por vários lotes ou
partes: «em que adquire ou um terceiro por si indicado, que não seja o transportador, adquire a posse física do último lote ou da última parte.»;
e) No caso de um contrato de entrega periódica de bens durante um determinado período:
«em que adquire ou um terceiro por si indicado, que não seja o transportador, adquire a posse física do primeiro bem.».
(2) Inserir aqui o seu nome, endereço geográfico e, eventualmente, número de telefone, e endereço de correio electrónico.
(3) Se der ao consumidor a possibilidade de preencher e apresentar por via electrónica informação sobre a retractação do contrato através do seu sítio Internet, inserir o seguinte:
«Dispõe também da possibilidade de preencher e apresentar por via electrónica o modelo de formulário de [retractação] ou qualquer outra declaração inequívoca de [retractação] através do nosso sítio Internet [inserir endereço Internet]. Se fizer uso dessa possibilidade, enviar-lhe-emos sem demora, num suporte duradouro (por exemplo, por correio electrónico), um aviso de recepção do pedido de retractação].».
(4) No caso de um contrato de compra e venda em que não se tenha oferecido para recolher os bens em caso de [retractação], inserir o seguinte:
«Podemos reter o reembolso até termos recebido os bens devolvidos, ou até que apresente prova do envio dos bens, consoante o que ocorrer primeiro.».
(5) No caso de o consumidor ter recebido bens no âmbito do contrato, inserir o seguinte:
a) Inserir:
- «Recolhemos os bens.», ou
- «Deve devolver os bens ou entregar-no-los ou a ... [insira o nome da pessoa e o endereço geográfico, se for caso disso, da pessoa que autoriza a receber os bens], sem demora injustificada e o mais tardar 14 dias a contar do dia em que nos informar da [retractação] do contrato. Considera-se que o prazo é respeitado se devolver os bens antes do termo do prazo de 14 dias.»;
b) Inserir:
- «Suportaremos os custos da devolução dos bens.»,
- «Tem de suportar os custos directos da devolução dos bens.»,
- Se, num contrato à distância, não se oferecer para suportar os custos da devolução dos bens e se estes, pela sua natureza, não puderem ser devolvidos normalmente pelo correio: «Tem de suportar os custos directos da devolução dos bens, ... EUR [inserir o montante].»; ou se o custo da devolução dos bens não puder ser razoavelmente calculado antecipadamente: «Tem de suportar os custos directos da devolução dos bens. Estes custos são estimados em aproximadamente ... EUR [inserir o montante] no máximo.», ou
- Se, num contrato celebrado fora do estabelecimento comercial, os bens, pela sua natureza, não puderem ser devolvidos normalmente pelo correio e tiverem sido entregues no domicílio do consumidor no momento da celebração do contrato: «Recolheremos os bens a expensas nossas.»;
c) «Só é responsável pela depreciação dos bens que decorra de uma manipulação que exceda o necessário para verificar a natureza, as características e o funcionamento dos bens.».
(6) No caso de um contrato de prestação de serviços ou de um contrato de fornecimento de água, gás ou electricidade, caso não sejam postos à venda em volume ou quantidade limitados, ou de aquecimento urbano, inserir o seguinte: «Se tiver solicitado que a prestação de serviços ou o fornecimento de água/gás/electricidade/aquecimento urbano [riscar o que não interessa] comece durante o prazo de[retractação], pagar-nos-á um montante razoável proporcional ao que lhe foi fornecido até ao momento em que nos comunicou a sua retractação] do presente contrato, em relação ao conjunto das prestações previstas no contrato.».
B. Modelo de formulário de [retractação]
(só deve preencher e devolver o presente formulário se quiser retractar-se do contrato)
- Para [inserir aqui o nome, o endereço geográfico e, eventualmente, e o endereço de correio electrónico do profissional]:
- Pela presente comunico/comunicamos (*) que me retracto / nos retractamos (*) do meu/nosso (*) contrato de compra e venda relativo ao seguinte bem/para a prestação do seguinte serviço
(*)
- Solicitado em (*)/recebido em (*)
- Nome do(s) consumidor(es)
- Endereço do(s) consumidor(es)
- Assinatura do(s) consumidor(es) (só no caso de o presente formulário ser notificado em papel)
(*) Riscar o que não interessa
Leia aqui as mudanças na Directiva de Direitos do Consumidor no Espaço Económico Europeu