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WAP billing: o que é? Como enfrentar uma tal prática-surpresa, em si mesma agressiva?

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Coluna semanal Site
Opinião 79
Por Mário Frota, apDC - Direito do Consumo - Coimbra

Por definição, trata-se de um mecanismo que faculta aos consumidores a aquisição de conteúdos digitais a partir de páginas WAP (Wireless Application Protocol), directamente debitados na factura de serviço de acesso à Internet ou descontados no saldo (no caso dos meios pré-pagos).

No vertente caso, porém, é de um pretenso “serviço- surpresa” que se trata, susceptível de ser debitado aos consumidores na factura dos serviços de comunicações electrónicas, sem fundamento legal, por lhes ser empontado sem o haverem requisitado.

Desde logo porque se trata, em bom rigor, de um CRIME DE BURLA

O Código Penal português reza no seu artigo 217:

“Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano sobre factos que astuciosamente provocou, determinar outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a outra pessoa, prejuízo patrimonial é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa”

E, depois, pelo ordenamento jurídico do consumo pátrio, já que a LDC – Lei de Defesa do Consumidor – prescreve no n.º 4 do seu artigo 9.º:

«O consumidor não fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração da coisa».

Mas tal hipótese também se acha prevista na LEI DAS PRÁTICAS COMERCIAIS DESLEAIS (DL 57/2008, de 26 de Março), como segue:

“É agressiva, em qualquer circunstância e, como tal proibida, a prática que consista em

«exigir o pagamento imediato ou diferido de bens e serviços ou a devolução ou a guarda de bens fornecidos pelo profissional que o consumidor não tenha solicitado...»(alínea f) artigo 12.º).

E, no n.º 1 do artigo 28 do DL 24/2014, de 14 de Fevereiro, se estatui que

«É proibida a cobrança de qualquer tipo de pagamento relativo a fornecimento não solicitado de bens, água, gás, electricidade, aquecimento urbano ou conteúdos digitais ou a prestação de serviços não solicitada pelo consumidor (…)».

A LDC, ademais, no seu artigo 9.º - A reforça tais proibições, a saber:

«1 - Antes de o consumidor ficar vinculado pelo contrato ou oferta, o fornecedor de bens ou prestador de serviços tem de obter o acordo expresso do consumidor para qualquer pagamento adicional que acresça à contraprestação acordada relativamente à obrigação contratual principal do fornecedor de bens ou prestador de serviços.

2 - A obrigação de pagamentos adicionais depende da sua comunicação clara e compreensível ao consumidor, sendo inválida a aceitação pelo consumidor quando não lhe tiver sido dada a possibilidade de optar pela inclusão ou não desses pagamentos adicionais.

3 - Quando, em lugar do acordo explícito do consumidor, a obrigação de pagamento adicional resultar de opções estabelecidas por defeito que tivessem de ser recusadas para evitar o pagamento adicional, o consumidor tem direito à restituição do referido pagamento.

4 - Incumbe ao fornecedor de bens ou prestador de serviços provar o cumprimento do dever de comunicação estabelecido no n.º 2.

5 - O disposto no presente artigo aplica-se à compra e venda, à prestação de serviços, aos contratos de fornecimento de serviços públicos essenciais de água, gás, electricidade, comunicações electrónicas e aquecimento urbano e aos contratos sobre conteúdos digitais

Se acaso o operador de comunicações electrónicas facturar tais montantes a acrescer aos do serviço essencial e exigir o pagamento na íntegra, pode o consumidor reclamar a quitação parcial (o pagamento só e tão só dos montantes que se acham contratados), de harmonia com o que estabelece o artigo 6.º da LEI DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS (Lei 23/96, de 26 de Julho), que dispõe como segue:

“Não pode ser recusado o pagamento de um serviço público, ainda que facturado juntamente com outros, tendo o utente direito a que lhe seja dada quitação daquele…”

Tais práticas configuram ainda um crime de especulação, previsto e punido pela Lei Penal do Consumo – artigo 35, que comina com pena de prisão e multa uma tal conduta: prisão de seis meses a três anos e multa não inferior a 100 dias.

Para além dos enunciados crimes de burla e especulação, constituem ainda ilícitos de consumo e ilícitos de mera ordenação social passíveis de coima (sanção pecuniária) e em sanções acessórias.

PROCON RS